21/01/12

Na Rua onde vivo

Todas as noites um grande número de voluntários saem à rua na
esperança de poderem colmatar, de alguma forma, as falhas do sistema.
Consigo levam a esperança de conseguirem construir estruturas de apoio, levam  tempo e disponibilidade.Numa época em que se prevê que a exclusão social aumente devido à situação económica do país, são estas as pessoas que fazem a diferença na
realidade ao seu alcance.

Entre eles há quem apenas se faça munir de chá que conforta o estômago e de uma boa dose de conversa que aquece a alma.São apenas ”distribuidores de palavras” que integram um projecto cujo objectivo é acabar com a solidão, Voluntários que fazem de um sem abrigo um amigo verdadeiro.
Nas rua já todos se conhecem pelo nome, e aos sábados, quando chegam estes voluntários, os sítios onde ficam a conversar enchem-se de sons agradáveis e risadas,sons de uma autentica “casa sem paredes”.
Do outro lado da rua está o “outro” a quem se dirigem, os habitantes das ruas da cidade. Homens e mulheres de todas as idades e géneros que dormem sobe o tecto embaciado do céu da grande Lisboa.São eles que esperam ansiosamente pela chegada dos voluntários que recebem em sua “casa”, esperam por alguém que os faça sorrir e esquecer por momentos que já não têm quase nada.
Senhor Nelson conhece bem este céu, conhece bem as ruas da cidade, o chão onde dorme há mais de cinco anos. Tem 60 anos e há dois anos atrás trocou as Arcadas do Terreiro do Paço ,onde dormia juntamente com outras pessoas sem-abrigo, pelo Largo do Caldas. Não teve escolha, visto que a Câmara
Municipal de Lisboa expulsou-os a todos.
Foi ainda nos tempos em que dormia nas arcadas, que conheceu Duarte e outros voluntários, ainda o projecto ia no início. A memória já lhe vai faltando, mas recorda com alegria o primeiro dia em que “alguém se sentou à [sua] beira e [tiveram] duas horas a dialogar e a trocar impressões”.
Durante todos estes anos de projecto, senhor Nelson foi recebendo todos os sábados à noite  de quinze em quinze dias, e sem falhas, a visita e presença de voluntários que ainda continuam a  vir para falar com ele. De todos eles houve alguns com quem estabeleceu laços mais fortes, porque lhe foram mais familiares e afectivos, “Mas todos são muito humildes e simpáticos e são bem-vindos [porque o que fazem] é um enriquecimento de humanismo”, acrescenta.
De todos, ficarão marcados para sempre aqueles que já por duas vezes lhe vieram trazer um bolo e cantar os parabéns no seu dia de anos. Assim como a voluntária Margarida que a título individual ( não era uma actividade do projecto) levou o senhor Nelson ao teatro de revista. Desse dia lembra-se ele muito bem “foi no dia 11 de Dezembro e fomos almoçar as portas de Santo Antão e às 16horas fomos ao teatro”.
Foi a segunda vez que foi ao teatro em toda a sua vida que já vai longa: “Gostei imenso e fiquei muito contente. Não tenho vida para frequentar o teatro”, afirma.
Passaram-se alguns anos, e o senhor Nelson contínua a dormir na rua.O objectivo do projecto não foi tirá-lo de lá, mas promover-lhe momentos de felicidade, aliviar a dor física do seu pé e a dor da sua alma com dois dedos de conversa.

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